sábado, 28 de julho de 2018

Áreas de Conteúdo - Área de Fomação Pessoal e Social - Convivência democrática e cidadania

    "Convivência democrática e cidadania 

    A vida no jardim de infância deverá organizar-se como um contexto de vida democrática, em que as crianças exercem o seu direito de participar, e em que a diferença de género, social, física, cognitiva, religiosa e étnica é aceite numa perspetiva de equidade, num processo educativo que contribui para uma maior igualdade de oportunidades entre mulheres e homens, entre indivíduos de diferentes classes sociais, com capacidades diversas e de diferentes etnias. Esta diversidade é entendida como forma de educação intercultural, em que as diferentes maneiras de ser e de saber contribuem para o enriquecimento da vida do grupo, para dar sentido à aquisição de novos saberes e à compreensão de diferentes culturas. 
    A promoção de uma maior igualdade de género é, nomeadamente, um elemento fundamental da educação para a cidadania e da construção de uma verdadeira democracia. Lidar com as diferenças sem as transformar em desigualdades é um dos grandes desafios da educação na atualidade. Compete ao/à educador/a desenvolver uma ação intencional, que conduza a uma efetiva igualdade de oportunidades entre rapazes e raparigas, no processo de socialização experienciado no jardim de infância. 
    A vida em grupo implica confronto de opiniões e necessidade de resolver conflitos que suscitarão a necessidade de debate e de negociação, de modo a encontrar uma resolução mutuamente aceite pelos intervenientes. 
    Deste modo, a participação das crianças na vida do grupo permite-lhes tomar iniciativas e assumir responsabilidades, exprimir as suas opiniões e confrontá-las com as dos outros, numa primeira tomada de consciência de perspetivas e valores diferentes, que facilitam a compreensão do ponto de vista do outro e promovem atitudes de tolerância, compreensão e respeito pela diferença. 
    É neste contexto que se desenvolve a educação para a cidadania, enquanto formação de pessoas responsáveis, autónomas, solidárias, que conhecem e exercem os seus direitos e deveres, em diálogo e no respeito pelos outros, com espírito democrático, pluralista, crítico e criativo.
    A educação para a cidadania relaciona-se também com o desenvolvimento progressivo do espírito crítico face ao mundo que rodeia a criança, incluindo nomeadamente os diferentes meios de comunicação com que contacta no dia a dia.
    O respeito e a valorização pelo ambiente natural e social e pelo património paisagístico são ainda abordados na Formação Pessoal e Social, numa perspetiva de corresponsabilização do que é de todos no presente e tendo em conta o futuro. O desenvolvimento destes valores articula-se e concretiza-se através de aprendizagens realizadas noutras áreas e domínios, nomeadamente a Educação Artística e o Conhecimento do Mundo.

    Aprendizagens a promover: 
    ▪ Desenvolver o respeito pelo outro e pelas suas opiniões, numa atitude de partilha e de responsabilidade social.  ▪ Respeitar a diversidade e solidarizar-se com os outros.
    ▪ Desenvolver uma atitude crítica e interventiva relativamente ao que se passa no mundo que a rodeia.
   ▪ Conhecer e valorizar manifestações do património natural e cultural, reconhecendo a necessidade da sua preservação.

    Estas aprendizagens podem ser observadas, por exemplo, quando a criança:
    ▪ Espera pela sua vez na realização de jogos e na intervenção nos diálogos, dando oportunidades aos outros para intervirem.
    ▪ Contribui para a elaboração das regras de vida em grupo, reconhece a sua razão e necessidade e procura cumpri-las.
    ▪ É progressivamente capaz de resolver situações de conflito de forma autónoma, através do diálogo.
    ▪ Perante opiniões e perspetivas diferentes da sua, escuta, questiona e argumenta, procurando chegar a resoluções ou conclusões negociadas.
     ▪ Demonstra comportamentos de apoio e entreajuda, por iniciativa própria ou quando solicitado.
    ▪ Reconhece a diversidade de características e hábitos de outras pessoas e grupos, manifestando respeito por crianças e adultos, independentemente de diferenças físicas, de capacidades, de género, de etnia, de cultura, de religião ou outras.
    ▪ Reconhece que as diferenças contribuem para o enriquecimento da vida em sociedade, identificando esses contributos em situações do quotidiano.
    ▪ Aceita que meninos e meninas, homens e mulheres podem fazer as mesmas coisas em casa e fora de casa.
   ▪ Identifica no seu contexto social (grupo, comunidade) algumas formas de injustiça ou discriminação, (por motivos de etnia, género, estatuto social, de incapacidade ou outras), propondo ou reconhecendo formas de as resolver ou minorar.
    ▪ Conhece manifestações do património artístico cultural e paisagístico (local, regional, nacional e mundial), manifestando interesse e preocupando-se com a sua preservação.
    ▪ Desenvolve um sentido estético perante manifestações artísticas de diferentes tempos e culturas.
    ▪ Reconhece a importância do património natural, identifica algumas das ameaças à sua conservação e adota práticas “amigas” do ambiente.     ▪ Utiliza diferentes recursos tecnológicos, enquanto meios de conhecimento, de expressão e comunicação e conhece os cuidados a ter.
    ▪ …

    O/A educador/a promove estas aprendizagens quando, por exemplo:
    ▪ Organiza o ambiente educativo, de modo a que todos, independentemente do género, etnia, capacidade intelectual ou física, sintam que fazem parte do grupo e têm as mesmas oportunidades.
    ▪ Seleciona materiais e recursos que não veiculem estereótipos de género, cultura ou etnia.
    ▪ Dialoga com as crianças sobre o modo como perspetivam a diferença (de género, cultura, etnia, etc.), apoiando-as a compreender situações de injustiça ou discriminação e a propor soluções.
    ▪ Manifesta respeito pelas necessidades, sentimentos, opiniões, culturas e valores das crianças e adultos.
    ▪ Valoriza as diversidades culturais das crianças e das suas famílias.
    ▪ Incentiva a tomada de decisão individual e coletiva e a resolução de conflitos pelo diálogo.
    ▪ Escuta o que as crianças dizem, apoia a explicitação das suas opiniões e incentiva a sua participação ativa nas conversas.
    ▪ Conversa com as crianças sobre os programas de TV favoritos, estimulando o debate de perspetivas diferentes.
    ▪ Incentiva boas práticas de proteção da natureza e dos bens culturais.
    ▪ …"

Área de Conteúdo - Área de Formação Pessoal e Social - Consciência de si como aprendente

"Consciência de si como aprendente

     A construção da autonomia não passa apenas pela participação na organização social do grupo, mas está também presente no desenvolvimento do processo de aprendizagem, em que as crianças escolhem o que querem fazer, fazem propostas e colaboram nas propostas do/a educador/a e das outras crianças, cooperam na elaboração de projetos comuns, sendo assim envolvidas no planeamento e na avaliação da aprendizagem.
    O desenvolvimento da consciência de si como sujeito que aprende tem como ponto de partida o que as crianças sabem e faz sentido para elas, tendo o/a educador/a um papel essencial ao refletir com as crianças sobre o processo de aprendizagem - o modo como fizeram, que saberes consideram ter adquirido e como podem continuar a aprender -, valorizando os diversos modos de aprender.     Este processo é facilitado quando o/a educador/a dialoga com as crianças sobre o que estão a fazer, coloca questões e dá sugestões, dando oportunidade para que elaborem, retomem e revejam as suas ideias, envolvendo-se numa construção conjunta do pensamento.
    A participação no seu processo de aprendizagem, em que cada criança se vai apercebendo do que aprendeu, como aprendeu e como ultrapassou dificuldades, permite-lhe ir tomando consciência de si enquanto aprendente. Esta consciência promove a persistência, a autoconfiança e o gosto por aprender, para que progressivamente se vá tornando capaz de autorregular a sua aprendizagem, isto é, “aprenda a aprender”.
    A consciência de si como aprendente não é apenas individual, mas alarga-se e enriquece-se pela partilha das aprendizagens no grupo. Cabe ao/a educador/a apoiar as crianças a cooperarem entre si, a exporem as suas ideias e a debaterem a forma como fizeram e poderiam melhorar, a fim de que cada criança contribua para a aprendizagem de todos e tome também consciência de si como aprendente.
    Essa consciência, iniciada na educação pré-escolar, irá ajudar a criança a enfrentar os desafios que se lhe vão ser colocados posteriormente e ao longo da vida.

    Aprendizagens a promover:  
    ▪ Ser capaz de ensaiar diferentes estratégias para resolver as dificuldades e problemas que se lhe colocam. 
    ▪ Ser capaz de participar nas decisões sobre o seu processo de aprendizagem. 
    ▪  Cooperar com outros no processo de aprendizagem.

    Estas aprendizagens podem ser observadas, por exemplo, quando a criança:
    ▪ Manifesta curiosidade pelo mundo que a rodeia, formulando questões sobre o que observa.
    ▪ Revela interesse e gosto por aprender, usando no quotidiano as novas aprendizagens que vai realizando.
    ▪ Expressa as suas opiniões, preferências e apreciações críticas, indicando alguns critérios ou razões que as justificam.
    ▪ Contribui para o funcionamento e aprendizagem do grupo, fazendo propostas, colaborando na procura de soluções, partilhando ideias, perspetivas e saberes e reconhecendo o contributo dos outros.
    ▪ Participa na planificação de atividades e de projetos individuais e coletivos cada vez mais complexos, explicitando o que pretende fazer, tendo em conta as escolhas dos outros e contribuindo para a elaboração de planos comuns.
    ▪ Colabora em atividades de pequeno e grande grupo, cooperando no desenrolar do processo e na elaboração do produto final.
    ▪ É progressivamente capaz de explicitar e de partilhar com o/a educador/a e as outras crianças o que descobriu e aprendeu.
    ▪ Avalia, apreciando criticamente, os seus comportamentos, ações e trabalhos, bem como os dos colegas, dando e pedindo sugestões para melhorar.
    ▪ Expressa as suas ideias, para criar e recriar atividades, materiais e situações do quotidiano e para encontrar novas soluções para problemas que se colocam (na vida do grupo, na aprendizagem), com recurso a diferentes tipos de linguagem (oral, escrita, matemática e diferentes linguagens artísticas).
    ▪ …


    O/A educador/a promove estas aprendizagens quando, por exemplo:
    ▪ Estimula a curiosidade das crianças, chamando a atenção para o que as rodeia, e questiona as suas observações.
    ▪ Apoia as crianças a relacionar o que já sabem com o que aprendem de novo.
    ▪ Escuta o que as crianças têm para dizer, apoiando a explicitação das suas razões, chamando a atenção para a diversidade de opiniões, a importância de as respeitar, procurando articular os diferentes contributos, e ajudar o grupo a chegar a novas conclusões.
    ▪ Apoia as crianças a explicitarem o que vão fazer e como, e também a relatarem o que fizeram e como, envolvendo-as nos processos de planeamento, realização e avaliação (individual, a pares, em pequeno grupo e em grande grupo).
    ▪ Acompanha as experiências que as crianças realizam, proporcionando um diálogo interativo entre elas, e envolvendo-se nesse diálogo, colocando perguntas abertas e incentivando a explicitação das suas ideias, de modo a facilitar a construção conjunta do pensamento.
    ▪ Apoia a criatividade das crianças na procura de soluções para os problemas que se colocam na vida do grupo e nas diferentes áreas de conteúdo.
    ▪ …

Área de Conteúdo - Área de Formação Pessoal e Social - Independência e autonomia

    "Independência e autonomia 

    Adquirir maior independência significa, na educação pré-escolar, ser progressivamente capaz de cuidar de si e utilizar os materiais e instrumentos à sua disposição. A independência das crianças e do grupo passa também por uma apropriação do espaço e do tempo que constitui a base de uma progressiva autonomia. 
    A construção da autonomia envolve uma partilha de poder entre o/a educador/a e as crianças, que têm a possibilidade de fazer escolhas e tomar decisões, assumindo progressivamente responsabilidades pela sua segurança e bem-estar, não só no jardim de infância, mas também em diversas situações da vida, demonstrando progressivamente consciência dos perigos que pode correr e da importância de hábitos de vida saudável. 
    A construção dessa autonomia passa por uma organização social participada do grupo em que as regras, elaboradas e negociadas entre todos, são compreendidas pelas crianças, e em que cada uma se compromete a aceitá-las, conduzindo a uma autorregulação do comportamento. Esta autonomia passa igualmente pela decisão coletiva sobre as tarefas necessárias ao bom funcionamento do grupo e a sua distribuição equitativa. Esta participação da vida no grupo permite às crianças tomarem iniciativas e assumirem responsabilidades, de modo a promover valores democráticos, tais como a participação a justiça e a cooperação.

    Aprendizagens a promover: 
    ▪ Saber cuidar de si e responsabilizar-se pela sua segurança e bem-estar. 
    ▪ Ir adquirindo a capacidade de fazer escolhas, tomar decisões e assumir responsabilidades, tendo em conta o seu bem-estar e o dos outros.

    Estas aprendizagens podem ser observadas, por exemplo, quando a criança:
    ▪ Realiza de forma cada vez mais independente as tarefas indispensáveis à vida do dia a dia (vestir-se, despir-se, lavar-se, comer utilizando adequadamente os talheres, etc.).
    ▪ Conhece os materiais disponíveis, a sua localização e se apropria progressivamente da utilização de jogos, tintas, pincéis, lápis etc., servindo-se deles com cuidado e arrumando-os quando já não precisa.
    ▪ Conhece os diferentes momentos da rotina diária, a sua sucessão, o que faz em cada um deles e para quê.
    ▪ Escolhe as atividades que pretende realizar e vai adquirindo progressivamente maior autonomia na seleção dos recursos disponíveis para as levar a cabo, sem perturbar o grupo.
    ▪ Se encarrega das tarefas que se comprometeu realizar, executando-as de forma cada vez mais autónoma.
    ▪ Adquire um maior controlo do seu corpo, força, agilidade, equilíbrio e coordenação muscular que lhe permitem realizar progressivamente movimentos mais complexos e precisos (subir e descer escadas, trepar, encaixar, recortar, etc.).
    ▪ Conhece e compreende a importância de normas e hábitos de vida saudável e de higiene pessoal e vai procurando pô-los em prática (distingue os alimentos saudáveis e a sua importância para a saúde, porque é importante fazer regularmente exercício físico, porquê e quando é preciso lavar as mãos e os dentes, etc.).
    ▪ Tem consciência dos riscos físicos que pode correr e adota normas de segurança em casa, no jardim de infância e na rua (tem alguma consciência e cuidado em situações em que se pode magoar, pedindo ajuda quando necessita, conhece e cumpre os cuidados a atravessar ruas, identifica o rótulo de perigo de produtos, etc.).
    ▪ Se preocupa com o bem-estar e segurança das outras crianças, alertando o adulto quando se apercebe que alguma corre perigo.
    ▪ …
   


    O/A educador/a promove estas aprendizagens quando, por exemplo:
    ▪ Dá oportunidade e tempo à criança para realizar as tarefas do dia a dia.
    ▪ Organiza as áreas e materiais da sala, com a participação das crianças, para que se apropriem da utilização do espaço e da localização dos diferentes tipos de material.
    ▪ Observa a utilização do espaço para saber da sua adequação ao grupo e consulta as crianças na sua modificação.
    ▪ Fala com as crianças sobre os momentos da rotina e sobre o que se faz em cada um deles.
    ▪ Facilita as escolhas das crianças, dando-lhes tempo para decidir, apoiando as suas iniciativas para as enriquecer e complexificar.
    ▪ Negoceia as tarefas necessárias à vida do grupo (tratar dos animais, arrumação da sala).
   ▪ Incentiva as crianças a encontrarem as suas formas próprias de resolução de problemas, ajudando-as quando recorrem ao/à educador/a.
   ▪ Sensibiliza as crianças para os problemas de segurança (materiais perigosos, segurança rodoviária, etc.).
   ▪ Tendo em conta o contexto, os interesses e questões colocadas pelas crianças, promove a importância dos hábitos de vida saudável.
    ▪ Envolve as famílias na construção da independência e autonomia, nomeadamente nos cuidados de segurança e saúde.
    ▪ …"

sábado, 21 de julho de 2018

Áreas de Conteúdo - Área de Formação Pessoal e Social - Construção da identidade e da autoestima

"1. Área de Formação Pessoal e Social

    A área de Formação Pessoal e Social é considerada uma área transversal, porque, embora tenha uma intencionalidade e conteúdos próprios, está presente em todo o trabalho educativo realizado no jardim de infância.  Tal deve.se ao facto de esta ser a ver com a forma como as crianças se relacionam consigo próprias, com os outros e com o mundo, num processo de desenvolvimento de atitudes, valores e disposições, que constituem as bases de uma aprendizagem bem-sucedida ao longo da vida e de uma cidadania autónoma, consciente e solidária.
    A área de Formação Pessoal e Social assenta, tal como as outras, no reconhecimento da criança como sujeito e agente do processo educativo, cuja identidade única se constrói em interação social, influenciando e sendo influenciada pelo meio que a rodeia.
    É nos contextos sociais em que vive, nas relações e interações com outros e com o meio que a criança vai construindo referências, que lhe permitem tomar consciência da sua identidade e respeitar a dos outros, desenvolver a sua autonomia como pessoa e como aprendente, compreender o que está certo e errado, o que pode e não pode fazer, os direitos e deveres para consigo e para com os outros, valorizar o património natural e social.
    É nessa inter-relação que a criança vai aprendendo a atribuir valor aos seus comportamentos e atitudes e aos dos outros, reconhecendo e respeitando valores que são diferentes dos seus. A educação pré-escolar tem um papel importante na educação para os valores, que não se “ensinam”, mas se vivem e aprendem na ação conjunta e nas relações com os outros.
    São os valores subjacentes à prática do/a educador/a e o modo como os concretiza no quotidiano do jardim de infância que permitem que a educação pré-escolar seja um contexto social e relacional facilitador da Formação Pessoal e Social. Ao demonstrarem atitudes de tolerância, cooperação, partilha, sensibilidade, respeito, justiça, etc. para com as crianças e adultos (outros profissionais e pais/famílias), os/as educadores/as contribuem para que as crianças reconheçam a importância desses valores e se apropriem deles.
    O desenvolvimento da Formação Pessoal e Social baseia-se na organização do ambiente educativo, construído como um ambiente relacional e securizante, em que a criança é valorizada e escutada, o que contribui para o seu bem-estar e autoestima, e, ainda, como um contexto democrático em que as crianças participam na vida do grupo e no desenvolvimento do processo da aprendizagem.
    O ambiente educativo estará também organizado como um espaço que favorece a educação estética, sendo que a educação pré-escolar proporcionará também múltiplas oportunidades de apreciar a beleza noutros contextos e situações, contactos com a natureza, a paisagem e com a cultura, que favorecem o desenvolvimento do sentido estético. A Formação Pessoal Social contribui, assim, para o desenvolvimento de valores éticos, mas também estéticos.
    A área de Formação Pessoal e Social, tendo conteúdos próprios, está intimamente relacionada com todas as outras áreas de conteúdo, que contribuem ou são uma ocasião para o seu desenvolvimento. Assim, os saberes, a curiosidade e o desejo de aprender das crianças são alargados através do contacto com as diversas manifestações de cultura a que essas áreas correspondem, permitindo, simultaneamente, desenvolver projetos que as mobilizam, de modo articulado e globalizante. 
    Ao participar ativamente no seu processo de aprendizagem, a criança vai mobilizar e integrar um conjunto de experiências, saberes e processos, atribuindo-lhe novos significados e encontrando formas próprias de resolver os problemas, o que lhe permite desenvolver não só a autonomia, mas também a criatividade.
    Dada a transversalidade da área de Formação Pessoal e Social, diversas aprendizagens enunciadas nesta área são retomadas noutras áreas, entendendo-se essas aprendizagens como correspondendo a um processo progressivo que, realizado ao longo da educação pré-escolar, terá continuidade ao longo da vida. Nessas aprendizagens interligadas consideram-se quatro componentes:  

                   ▪ Construção da identidade e da autoestima; 
                   ▪ Independência e autonomia; 
                   ▪ Consciência de si como aprendente; 
                   ▪ Convivência democrática e cidadania.

    Construção da identidade e da autoestima
    
    A construção da identidade passa pelo reconhecimento das características individuais e pela compreensão das capacidades e dificuldades próprias de cada um, quaisquer que estas sejam.
    Nas crianças em idade pré-escolar, a noção do eu está ainda em construção e é influenciada positiva ou negativamente pelo modo como os adultos significativos e as outras crianças a reconhecem.
    A construção da autoestima depende, assim, da forma como os adultos, nomeadamente o/a educador/a, intencionalmente valorizam, respeitam, estimulam a criança e encorajam os seus progressos, pelo modo como apoiam as relações e interações no grupo, para que todas as crianças se sintam aceites e as suas diferenças consideradas como contributos para enriquecer o grupo e não como fonte de discriminação ou exclusão.
    Ser menino ou menina é um aspeto central na construção da identidade e as crianças em idade pré-escolar vão assumindo comportamentos conformes com as expetativas culturais sobre o que é apropriado fazer enquanto membro de um ou de outro grupo, manifestando estereótipos culturais referentes aos homens e às mulheres. Importa que o/a educador/a esclareça estes estereótipos discriminatórios com as crianças, questionando situações que vão ocorrendo na vida do grupo, e que também reflita  sobre as suas atitudes, os materiais, recursos e atividades que propõe.
    Neste processo de construção de identidade e da autoestima, o reconhecimento das características singulares de cada criança desenvolve-se simultaneamente com a perceção do que tem em comum e do que a distingue de outros, pelo que o reconhecimento de laços de pertença social e cultural faz também parte da construção da identidade e da autoestima. Esta construção é apoiada pelo/a educador/a, ao respeitar e valorizar a cultura de cada criança e da sua família.

    Aprendizagens a promover: 
    ▪ Conhecer e aceitar as suas características pessoais e a sua identidade social e cultural, situando-as em relação às de outros. 
      ▪ Reconhecer e valorizar laços de pertença social e cultural.

    Estas aprendizagens podem ser observadas, por exemplo, quando a criança:
    ▪ Identifica as suas características individuais (sexo, idade, nome, etc.), e reconhece semelhanças e diferenças com as características dos outros.
    ▪ Verbaliza as necessidades relacionadas como o seu bem-estar físico (tem fome, tem que ir à casa de banho).
    ▪ Expressa as suas emoções e sentimentos (está triste, contente, etc.) e reconhece também emoções e sentimentos dos outros.
    ▪ Manifesta os seus gostos e preferências (alimentos, locais, jogos, etc.).
    ▪ Mantém e justifica as suas opiniões, aceitando também as dos outros.
    ▪ Demonstra prazer nas suas produções e progressos (gosta de mostrar e de falar do que faz, de comunicar o que descobriu e aprendeu).
    ▪ Revela confiança em experimentar atividades novas, propor ideias e falar em grupo.
    ▪ Aceita algumas frustrações e insucessos (perder ao jogo, dificuldades de realizar atividades e tarefas) sem desanimar, procurando formas de as ultrapassar e de melhorar (pedindo ajuda do/a educador/a ou de outras crianças, ensaiando outras formas de fazer, ou procurando novos materiais).
    ▪ Representa papéis e situações da sua cultura familiar em momentos de jogo dramático.
    ▪ Reconhece a sua pertença a diferentes grupos sociais (família, escola, comunidade, entre outros).
    ▪ Identifica e valoriza traços da sua cultura familiar, mas também os de outras culturas, compreendendo o que têm de comum e de diferente e que as culturas vão evoluindo.
    ▪ …
    O/A educador/a promove estas aprendizagens quando, por exemplo:
    ▪ Valoriza e respeita cada criança, manifestando essa atitude de modo a que constitua um modelo da relação entre crianças.
    ▪ Está atento a cada criança e ao que esta pretende transmitir, verbal ou não verbalmente.
    ▪ Identifica e valoriza o comportamento positivo da criança.
    ▪ Apoia a criança a expressar opiniões sobre o que vê, ouve ou sente.
    ▪ Respeita a diferença e tira proveito da diversidade como meio de enriquecimento do ambiente educativo e do processo de aprendizagem.
    ▪ Manifesta respeito pelas culturas familiares de cada criança, (tendo, por ex., na sala materiais representativos dessas culturas).
    ▪ Promove o sentido de pertença da criança a uma comunidade, facilitando as interações com pessoas e recursos e com o contexto próximo.
    ▪ Alarga as referências culturais das crianças através do contacto com diferentes recursos e formas de cultura.
    ▪ …

sexta-feira, 20 de julho de 2018

Áreas de Conteúdo

    "Consideram-se as “áreas de conteúdo” como âmbitos de saber, com uma estrutura própria e com pertinência sociocultural, que incluem diferentes tipos de aprendizagem, não apenas conhecimentos, mas também atitudes, disposições e saberes-fazer. Deste modo, a criança realiza aprendizagens com sentido, sendo capaz de as utilizar noutras situações quotidianas, desenvolvendo atitudes positivas face às aprendizagens e criando disposições favoráveis para continuar a aprender.
    O tratamento das diferentes áreas de conteúdo baseia-se nos fundamentos e princípios comuns a toda a pedagogia para a educação de infância, pressupondo o desenvolvimento e a aprendizagem como vertentes indissociáveis do processo educativo e uma construção articulada do saber em que as diferentes áreas serão abordadas de forma integrada e globalizante.
    A perspetiva holística, que caracteriza a aprendizagem da criança e que está subjacente ao brincar, estará também presente na abordagem das diferentes áreas de conteúdo. Ao brincar, as crianças vão-se apropriando de conceitos que lhes permitem dar sentido ao mundo e em que o/a educador/a pode reconhecer o contributo para a aprendizagem de diversos tipos de conhecimento, tais como, a língua, a matemática, as ciências. É esta curiosidade e interesse das crianças por explorar e compreender que dará progressivamente lugar à sua participação no desenvolvimento de projetos de aprendizagem mais complexos, que mobilizam diferentes áreas de conteúdo. Não há, assim, uma oposição, mas uma complementaridade e continuidade, entre o brincar e as aprendizagens a realizar nas diferentes áreas de conteúdo.
    Esta perspetiva de continuidade entre brincar e aprender articula-se com o reconhecimento da criança como sujeito e agente do processo educativo, que lhe garante o direito de ser escutada nas decisões relativas à sua aprendizagem e de participar no desenvolvimento do currículo. No contexto relacional e de interação social do jardim de infância, e partindo das experiências e saberes únicos da criança, considerada como capaz de construir a sua aprendizagem, cada uma aprende e contribui para a aprendizagem e progresso das outras.
    A distinção entre áreas de conteúdo corresponde a uma chamada de atenção para aprendizagens a contemplar, que devem ser vistas de forma articulada, dado que a construção do saber se processa de forma integrada, e há inter-relações entre os diferentes conteúdos, bem como aspetos formativos que lhes são comuns. As áreas de conteúdo são, assim, referências a ter em conta na observação, planeamento e avaliação do processo educativo e não compartimentos estanques a serem abordados separadamente.
    Baseando-se nestes princípios e fundamentos, a designação das áreas de conteúdo apresenta algumas semelhanças com as utilizadas noutros níveis do sistema educativo. Esta designação, com o intuito de favorecer a articulação da educação pré-escolar com o ensino básico e facilitar a comunicação entre educadores e professores, não significa que a educação pré-escolar se deva centrar numa preparação para o 1.º ciclo, mas sim num desenvolvimento de saberes e disposições, que permitam a cada criança ter sucesso, não só na etapa seguinte, mas também na aprendizagem ao longo da vida.
    
    O/A educador/a tem um papel fundamental no processo de aprendizagem de forma a: 
    ▪ articular a abordagem das diferentes áreas de conteúdo e domínios, para que se integrem num processo flexível de aprendizagem que corresponda às suas intenções pedagógicas e que, tendo a participação da criança, faça sentido para ela. Esta articulação poderá partir da escolha de uma “entrada” por uma área ou domínio, para integrar outros;  
    ▪ planear oportunidades de aprendizagem progressivamente mais complexas, tendo em conta o que observa e avalia sobre o desenvolvimento e aprendizagem de cada criança e a evolução do grupo; 
    ▪ apoiar cada criança para que atinja níveis a que não chegaria por si só, facilitando uma aprendizagem cooperada, que dê oportunidade às crianças de colaborarem no processo de aprendizagem umas das outras; 
    ▪ diferenciar o processo de aprendizagem, propondo situações que sejam suficientemente interessantes e desafiadoras para a criança, mas de cuja exigência não resulte desencorajamento e diminuição da autoestima.
    Para clarificar melhor o desenvolvimento e aprendizagem em cada área e a sua articulação com outras, adotou-se uma estrutura global, com adaptações em alguns domínios que fazem parte da Área de Expressão e Comunicação e cujas razões serão explicitadas na introdução a esta área. Assim, cada área contempla:  
    ▪ um texto introdutório, que fundamenta o seu sentido e algumas relações com outras áreas e domínios. Estas articulações, também retomadas ao longo do texto, são apresentadas a título indicativo, cabendo a cada educador/a encontrar outras possibilidades; 
    ▪ especificação de diferentes componentes, que integram o desenvolvimento da área, com indicação das aprendizagens globais a promover em cada uma;  
    ▪ apresentação de exemplos de algumas situações que ilustram a evolução do processo de aprendizagem. Estes exemplos não constituem listas de verificação, nem esgotam as aprendizagens a realizar, constituindo referências para situar a observação do/a educador/a e os progressos das crianças; 
    ▪ exemplos de estratégias, que poderão ser utilizadas pelo/a educador/a para promover essas aprendizagens. Estas são também indicadas a título exemplificativo, cabendo a cada educador/a escolher as mais adequadas ao seu contexto e grupo ou definir outras; 
    ▪ no final, é apresentada uma síntese das aprendizagens a promover em cada componente, seguida de um conjunto de sugestões de reflexão, que o/a educador/a poderá utilizar individualmente ou em conjunto com outros profissionais.
    Esta forma de apresentação tem como finalidade apoiar o/a educador/a na construção e gestão do currículo, não pretendendo ser limitativa das suas opções, práticas e criatividade."


Enquadramento Geral das Orientações Curriculares para a Educação de Infância (OCEPE)

"3. Organização do ambiente educativo

    As organizações educativas são contextos que exercem determinadas funções, dispondo para isso de tempos e espaços próprios e em que se estabelecem diferentes relações entre os intervenientes. A organização dinâmica destes contextos educativos pode ser vista segundo uma perspetiva sistémica e ecológica. Esta abordagem assenta no pressuposto de que o desenvolvimento humano constitui um processo dinâmico de relação com o meio, em que o indivíduo é influenciado, mas também influencia o meio em que vive.
    Para compreender a complexidade do meio, importa considerá-lo como constituído por diferentes sistemas que desempenham funções específicas e que, estando em interconexão, se apresentam como dinâmicos e em evolução. Assim, o indivíduo em desenvolvimento interage com diferentes sistemas que estão eles próprios em evolução.
    Nesta abordagem, importa distinguir os sistemas restritos e imediatos, com características físicas e materiais particulares — a casa, a sala de jardim de infância, a rua, etc. — em que há uma interação direta entre atores que aí desempenham diferentes papéis — pai ou mãe, filho/a, docente, aluno/a, etc. — e desenvolvem formas de relação interpessoal, implicando-se em atividades específicas que se realizam em espaços e tempos próprios. São exemplos destes sistemas restritos, com particular importância para a educação da criança, o meio familiar e o contexto de educação pré-escolar.
    As relações que se estabelecem entre estes e outros sistemas restritos formam um outro tipo de sistema com características e finalidades próprias (as relações entre famílias e o contexto de educação de infância). Por seu turno, estes sistemas são englobados por sistemas sociais mais alargados que exercem uma influência sobre eles (por exemplo, a organização da educação de infância no sistema educativo e no sistema social influenciam o funcionamento dos jardins de infância).
    Estas interações podem ser representadas de forma esquemática: 
    A abordagem sistémica e ecológica constitui, assim, uma perspetiva de compreensão da realidade que permite adequar, de forma dinâmica, o contexto do estabelecimento educativo às características e necessidades das crianças e adultos, tornando-se, ainda, um instrumento de análise para que o/a educador/a possa adaptar a sua intervenção às crianças e ao meio social em que trabalha, pois possibilita:
    — compreender melhor cada criança, ao conhecer os sistemas em que esta cresce e se desenvolve, de forma a respeitar as suas características pessoais, cultura e saberes já adquiridos, apoiando a sua maneira de se relacionar com os outros e com o meio social e físico;
    — contribuir para a dinâmica do contexto de educação pré-escolar na sua interação interna (relações entre crianças e crianças e adultos) e na interação que estabelece com outros sistemas que também influenciam a educação das crianças (relação com as famílias) e ainda com o meio social envolvente e a sociedade em geral, de modo a que esse contexto se organize para responder melhor às suas características e necessidades;
    — perspetivar o processo educativo de forma integrada, tendo em conta que a criança constrói o seu desenvolvimento e aprendizagem, de forma articulada, em interação com os outros e com o meio;
    — permitir a utilização e gestão integrada dos recursos do estabelecimento educativo e de recursos que, existindo no meio social envolvente, podem ser dinamizados;
   — acentuar a importância das interações e relações entre os sistemas que têm uma influência direta ou indireta na educação das crianças, de modo a tirar proveito das suas potencialidades e ultrapassar as suas limitações, para alargar e diversificar oportunidades educativas das crianças e apoiar o trabalho dos adultos.
    
    Tendo em conta os diferentes sistemas em interação, analisam-se seguidamente algumas características relevantes para a organização do ambiente educativo na educação pré-escolar: 

     ▪  Organização do estabelecimento educativo     

     ▪ Organização do ambiente educativo da sala 
        – Organização do grupo 
        – Organização do espaço  
        – Organização do tempo 

    ▪ Relações entre os diferentes intervenientes. 

    Organização do estabelecimento educativo
    O estabelecimento educativo deve organizar-se como um contexto facilitador do desenvolvimento e da aprendizagem das crianças, proporcionando também oportunidades de formação dos adultos que nele trabalham. Estabelece procedimentos de interação entre os diferentes intervenientes (entre crianças, entre crianças e adultos e entre adultos), tem um papel na gestão de recursos humanos e materiais, o que implica a prospeção de meios para melhorar as funções educativas da instituição. O estabelecimento educativo tem uma influência determinante no trabalho que o/a educador/a realiza com o seu grupo de crianças e pais/famílias, bem como na dinâmica da equipa educativa.
    Cada estabelecimento educativo tem as suas características próprias e uma especificidade que decorre da rede em que está incluído (pública, privada solidária ou privada cooperativa), da dimensão e dos recursos materiais e humanos de que dispõe, diferenciando-se ainda pelos níveis educativos que engloba. Muitos estabelecimentos educativos, para além da educação pré-escolar, incluem outros níveis educativos como a creche ou os ensinos básico e secundário. Esta inserção num contexto organizacional mais vasto permite tirar proveito de recursos humanos e materiais, facilitando ainda a continuidade educativa.
    A dinâmica própria de cada estabelecimento educativo está consignada no seu projeto educativo, como instrumento de orientação global da sua ação e melhoria, complementado pelo regulamento da instituição, que prevê as funções e formas de relação com os diversos grupos que compõem a comunidade (órgãos de gestão, profissionais, pais/famílias e alunos). Estas linhas gerais de orientação, e nomeadamente o projeto educativo de estabelecimento educativo/agrupamento de escolas, enquadram o trabalho educativo dos profissionais e a elaboração do projetos curriculares de grupo. A contribuição dos educadores na elaboração do projeto educativo e o modo como o concretizam confere-lhes também um papel na sua avaliação.
    Há ainda determinados aspetos da gestão do estabelecimento educativo que têm uma influência direta nas salas de jardim de infância, tais como a distribuição de grupos e horários dos diferentes profissionais, critérios de composição dos grupos e organização global do tempo (horas de entrada e saída, horas de almoço, disponibilidade de utilização de recursos comuns).
    Os estabelecimentos educativos proporcionam, também, um espaço alargado de desenvolvimento e aprendizagem de todas as crianças, em que a partilha dos espaços comuns (entrada, corredores, refeitório, biblioteca, ginásio, etc.) deverá ser planeada em conjunto pela equipa educativa.
    A organização do tempo não letivo é também decidida a nível do estabelecimento educativo, importando que o/a educador/a planeie e supervisione a sua concretização, tendo em conta as finalidades que a distinguem da componente letiva, mas assegurando uma coerência de princípios educativos entre estes dois tempos.
    Neste contexto global, cada sala organiza-se de forma a dar resposta ao desenvolvimento e aprendizagem de um determinado grupo de crianças.

   Organização do ambiente educativo da sala
    A educação pré-escolar é um contexto de socialização em que a aprendizagem se contextualiza nas vivências relacionadas com o alargamento do meio familiar de cada criança e nas experiências relacionais proporcionadas. Este processo educativo realiza-se num determinado tempo, situa-se num espaço que dispõe de materiais diversos e implica a inserção da criança num grupo em que esta interage com outras crianças e adultos.
    A organização do grupo, do espaço e do tempo constituem dimensões interligadas da organização do ambiente educativo da sala. Esta organização constituiu o suporte do desenvolvimento curricular, pois as formas de interação no grupo, os materiais disponíveis e a sua organização, a distribuição e utilização do tempo são determinantes para o que as crianças podem escolher, fazer e aprender. Importa, assim, que o/a educador/a reflita sobre as oportunidades educativas que esse ambiente oferece, ou seja, que planeie intencionalmente essa organização e avalie o modo como contribui para a educação das crianças, introduzindo os ajustamentos e correções necessários.

    Organização do grupo

    Na educação pré-escolar, o grupo proporciona o contexto imediato de interação social e de socialização através da relação entre crianças, crianças e adultos e entre adultos. Esta dimensão relacional constitui a base do processo educativo.
    Há diferentes fatores que influenciam o modo próprio de funcionamento de um grupo, tais como as características individuais das crianças que o compõem, o maior ou menor número de crianças de cada sexo, a diversidade de idades ou a dimensão do grupo.
    Estes fatores são influenciados pelas condições institucionais em que o jardim de infância se insere e pelas características demográficas da população que serve. A decisão da composição etária deve, porém, corresponder a uma opção pedagógica, tendo em conta que a interação entre crianças em momentos diferentes de desenvolvimento e com saberes diversos é facilitadora do desenvolvimento e da aprendizagem. A existência de grupos com crianças de diferentes idades acentua a diversidade e enriquece as interações no grupo, proporcionando múltiplas ocasiões de aprendizagem entre crianças.
    Qualquer que seja a composição do grupo, a relação individualizada que o/a educador/a estabelece com cada criança é facilitadora da sua inclusão no grupo e das relações com as outras crianças. Na educação de infância, cuidar e educar estão intimamente relacionados, pois ser responsável por um grupo de crianças exige competências profissionais que se traduzem, nomeadamente, por prestar atenção ao seu bem-estar emocional e físico e dar resposta às suas solicitações (explícitas ou implícitas). Este cuidar ético envolve assim a criação de um ambiente securizante em que cada criança se sente bem e em que sabe que é escutada e valorizada.
    A relação que o/a educador/a estabelece com as crianças assume diversas formas, que têm de ser intencionalmente pensadas e adaptadas às situações. Estar atento/a e escutar as crianças, ao longo dos vários momentos do dia, permite ao/à educador/a perceber os seus interesses e ter em conta as suas propostas para negociar com elas o que será possível fazer, ou para se decidir em conjunto o que é de continuar ou o que está terminado, para se passar a uma nova proposta. Neste processo relacional, o/a educador/a: apoia as atividades escolhidas pelas crianças e a realização das que propõe; valoriza de forma empática os trabalhos apresentados pelas crianças, as suas descobertas e as soluções que encontram para resolver problemas e dificuldades; estimula quem tem mais dificuldade em partilhar o que pensa; modera debates e negociações; propõe ainda ideias que levem as crianças a terem vontade de melhorar o seu trabalho.
    As dinâmicas de interação que se estabelecem têm implicações nos processos de aprendizagem, no sentido de promover:
    Respeito por cada criança e sentimento de pertença a um grupo – a forma como o/a educador/a está atento/a e se relaciona com as crianças, apoia as interações e relações no grupo, contribuem para o desenvolvimento da autoestima e de um sentimento de pertença que permite às crianças tomar consciência de si mesmas na relação com outros. A vivência num grupo social alargado constitui ainda a base do desenvolvimento da área de Formação Pessoal e Social e da aprendizagem da vida democrática, o que implica que o/a educador/a crie situações diversificadas de conhecimento, atenção e respeito pelo outro, bem como de desenvolvimento do sentido crítico e de tomada de decisões baseada na negociação.
    Trabalho cooperado – O trabalho entre pares e em pequenos grupos, em que as crianças têm oportunidade de confrontarem os seus pontos de vista e de colaborarem na resolução de problemas ou dificuldades colocadas por uma tarefa comum, alarga as oportunidades educativas, ao favorecer uma aprendizagem cooperada em que a criança se desenvolve e aprende, contribuindo para o desenvolvimento e para a aprendizagem das outras. Trabalhar em grupos constituídos por crianças com diversas idades ou em momentos diferentes de desenvolvimento permite que as ideias de uns influenciem as dos outros. Este processo contribui para a aprendizagem de todos, na medida em que constitui uma oportunidade de explicitarem as suas propostas e escolhas e como as conseguiram realizar.
    Entendimento da perspetiva do outro – O desenvolvimento social faz-se através de duas vertentes contraditórias: a necessidade de relação de proximidade com os outros e o desejo de afirmação e de autonomia pessoal.
    Neste sentido, o/a educador/a deve apoiar a compreensão que as crianças têm, desde muito cedo, dos sentimentos, intenções e emoções dos outros, facilitando o desenvolvimento da compreensão do que os outros pensam, sentem e desejam. Cabe também ao/à educador/a, em situações de conflito, apoiar a explicitação e aceitação dos diferentes pontos de vista, favorecendo a negociação e a resolução conjunta do problema.
    Regulação da vida em grupo – A participação das crianças no processo educativo através de oportunidades de decisão em comum, de regras coletivas indispensáveis à vida social e à distribuição de tarefas necessárias à organização do grupo constituem experiências de vida democrática que permitem tomar consciência dos seus direitos e deveres.
    As razões das normas que decorrem da vida em grupo (por exemplo, esperar pela sua vez, arrumar o que desarrumou, etc.) terão de ser explicitadas e compreendidas pelas crianças, como o respeito pelos direitos de cada uma, indispensáveis à vida em comum. Estas normas e outras regras adquirem maior força e sentido se todo o grupo participar na sua elaboração, bem como na distribuição de tarefas necessárias à vida coletiva (por exemplo, regar as plantas, tratar de animais, encarregar-se de pôr a mesa, distribuir refeições, etc.)
    Participação no planeamento e avaliação – Ao participarem no planeamento e avaliação, as crianças estão a colaborar na construção do seu processo de aprendizagem. Planear e avaliar com as crianças individualmente, em pequenos grupos ou no grande grupo são oportunidades de participação e meios de desenvolvimento cognitivo e da linguagem. Esta participação é uma condição de organização democrática do grupo, sendo também suporte da aprendizagem nas diferentes áreas de conteúdo.


    Organização do espaço

    Os espaços de educação pré-escolar podem ser diversos, mas o tipo de equipamento, os materiais existentes e a sua organização condicionam o modo como esses espaços e materiais são utilizados enquanto recursos para o desenvolvimento das aprendizagens.
    A organização do espaço da sala é expressão das intenções do/a educador/a e da dinâmica do grupo, sendo indispensável que este/a se interrogue sobre a sua função, finalidades e utilização, de modo a planear e fundamentar as razões dessa organização.
    A reflexão permanente sobre a funcionalidade e adequação dos espaços permite que a sua organização vá sendo modificada, de acordo com as necessidades e evolução do grupo. Esta reflexão é condição indispensável para evitar espaços estereotipados e padronizados que não são desafiadores para as crianças.
    O conhecimento do espaço e das suas possibilidades é uma condição do desenvolvimento da independência e da autonomia da criança e do grupo, o que implica que as crianças compreendam como está organizado e pode ser utilizado, participando nessa organização e nas decisões sobre as mudanças a realizar. Esta apropriação do espaço dá-lhes a possibilidade de fazerem escolhas, de utilizarem os materiais de diferentes maneiras, por vezes imprevistas e criativas, e de forma cada vez mais complexa.
    A importância dos materiais na aprendizagem das crianças implica que o/a educador/a defina prioridades na sua aquisição, de acordo com as necessidades das crianças e o projeto curricular de grupo. A progressão do desenvolvimento e da aprendizagem das crianças, ao longo do ano, levará à introdução de novos espaços e materiais, que sejam mais desafiadores e correspondam aos interesses que vão sendo manifestados.
    A escolha de materiais deverá atender a critérios de qualidade e variedade, baseados na funcionalidade, versatilidade, durabilidade, segurança e valor estético. A utilização de material reutilizável (caixas de diferentes tamanhos, bocados de canos, interior de embalagens, bocados de tecidos, pedaços de madeira, fios, etc.), bem como material natural (pedras, folhas sementes, paus) podem proporcionar inúmeras aprendizagens e incentivar a criatividade, contribuindo ainda para a consciência ecológica e facilitando a colaboração com os pais/famílias e a comunidade.
    Na organização deste espaço não pode ainda ser descurada a forma como são utilizadas as paredes. O que está exposto constitui uma forma de comunicação, que sendo representativa dos processos desenvolvidos, os torna visíveis tanto para crianças como para adultos. Por isso, a sua apresentação deve ser partilhada com as crianças e corresponder a preocupações estéticas.
    O espaço exterior  é igualmente um espaço educativo pelas suas potencialidades e pelas oportunidades educativas que pode oferecer, merecendo a mesma atenção do/a educador/a que o espaço interior. Se as atividades que se realizam habitualmente na sala também podem ter lugar no espaço exterior, este tem características e potencialidades que permitem um enriquecimento e diversificação de oportunidades educativas.
    O espaço exterior é um local privilegiado para atividades da iniciativa das crianças que, ao brincar, têm a possibilidade de desenvolver diversas formas de interação social e de contacto e exploração de materiais naturais (pedras, folhas, plantas, paus, areia, terra, água, etc.) que, por sua vez, podem ser trazidos para a sala e ser objeto de outras explorações e utilizações. É ainda um espaço em que as crianças têm oportunidade de desenvolver atividades físicas (correr, saltar, trepar, jogar à bola, fazer diferentes tipos de jogos de regras, etc.), num ambiente de ar livre.
    Estas múltiplas funções do espaço exterior exigem que o/a educador/a reflita sobre as suas potencialidades e que a sua organização seja cuidadosamente pensada, nomeadamente no que se refere à introdução de materiais e equipamentos que apelem à criatividade e imaginação das crianças e que atendam a critérios de qualidade, com particular atenção às questões de segurança.
    O espaço educativo inclui ainda os espaços comuns a todo o estabelecimento educativo (hall, corredores, biblioteca, refeitórios, salas polivalentes, etc.) que o/a educador/a, utiliza e rentabiliza, tendo em conta as decisões tomadas por toda a equipa educativa do estabelecimento educativo.
    
    Organização do tempo
 
    O tempo educativo tem uma distribuição flexível, embora corresponda a momentos que se repetem com uma certa periodicidade. A sucessão de cada dia, as manhãs e as tardes têm um determinado ritmo, existindo, deste modo, uma rotina que é pedagógica porque é intencionalmente planeada pelo/a educador/a e porque é conhecida pelas crianças, que sabem o que podem fazer nos vários momentos e prever a sua sucessão, tendo a liberdade de propor modificações. Nem todos os dias são iguais, as propostas do/a educador/a ou das crianças podem modificar o quotidiano habitual.
    O tempo diário inscreve-se num tempo, semanal, mensal e anual, que tem ritmos próprios e cuja organização tem, também, de ser planeada. A vivência destas diferentes unidades de tempo permite que a criança se vá progressivamente apropriando de referências temporais que são securizantes e que servem como fundamento para a compreensão do tempo: passado, presente, futuro.
    Porque o tempo é de cada criança, do grupo e do/a educador/a, importa que a sua organização seja decidida pelo/a educador/a e pelas crianças. Um tempo que contemple de forma equilibrada diversos ritmos e tipos de atividade, em diferentes situações — individual, com outra criança, com um pequeno grupo, com todo o grupo — e permita oportunidades de aprendizagem diversificadas. Trata-se de prever e organizar um tempo simultaneamente estruturado e flexível, em que os diferentes momentos tenham sentido para as crianças e que tenha em conta que precisam de tempo para fazerem experiências e explorarem, para brincarem, para experimentarem novas ideias, modificarem as suas realizações e para as aperfeiçoarem. 

    Relações entre os diferentes intervenientes
 
    Numa perspetiva sistémica e ecológica, as relações e interações que se estabelecem entre os diferentes intervenientes do processo educativo são essenciais para o desenvolvimento desse processo. O ambiente educativo da sala de jardim de infância e do estabelecimento educativo proporcionam múltiplas formas de relações recíprocas, que se enumeram, dado o papel que o/a educador/a desempenha na promoção dessas relações e no aproveitamento das suas potencialidades, para a educação das crianças e para o seu desenvolvimento profissional.

    Relações entre crianças e crianças e adultos

    A relação que o/a educador/a estabelece com as crianças e o modo como incentiva a sua participação facilita as relações entre as crianças do grupo e a cooperação entre elas. A ação do/a educador/a permite também que as crianças beneficiem de oportunidades que são proporcionadas pela frequência de um estabelecimento educativo, alargando as suas relações com outras crianças de diferentes idades e níveis educativos. Este contexto, possibilita que participem no desenvolvimento de atividades e projetos com outras crianças e grupos, que compreendam e aceitem regras de convivência que envolvem crianças de diferentes idades (cuidados com os mais novos, apoio dos mais velhos), e ainda que tenham contactos e relações com diferentes adultos. Estas situações ampliam e enriquecem a sua aprendizagem e as suas competências sociais.
    As experiências que a criança realiza no jardim de infância têm, também, influência nas relações familiares, pois o que criança transmite em casa sobre o que faz e aprende é motivo de conversa com os pais/famílias, o que facilita as relações familiares, contribuindo para o interesse dos pais/famílias em participarem no processo educativo desenvolvido no estabelecimento educativo. A criança é assim mediadora entre a escola e a família.
 
    Relações com pais/famílias
 
    Os pais/famílias e o estabelecimento de educação pré-escolar são dois contextos sociais que contribuem para a educação da mesma criança; importa, por isso, que haja uma relação entre estes dois sistemas.
    As relações com os pais/famílias podem revestir várias formas e níveis, em que se pode distinguir a relação que se estabelece com cada família, da relação organizacional que implica coletivamente os pais/famílias.
    A relação que o/a educador/a estabelece com cada família centra-se na criança e tem em conta que são coeducadores da mesma criança. Esta relação assenta numa comunicação que se realiza através de trocas informais (orais ou escritas) ou em momentos planeados (reuniões com cada família). Estes momentos constituem ocasiões para conhecer as suas necessidades e expetativas educativas, ouvir as suas opiniões e sugestões, incentivar a sua participação, e, ainda, para combinar as formas de participação que melhor correspondem às suas disponibilidades. A avaliação que o/a educador/a realiza do processo desenvolvido por cada criança e dos seus progressos torna-se um recurso fundamental nessa comunicação.
    O planeamento de estratégias diversificadas permitirá que todos participem. Se há pais/ famílias que poderão, eventualmente, vir ao jardim de infância para contarem uma história, falarem da sua profissão, acompanharem visitas e passeios, etc., para os que não podem vir à sala serão encontradas outras formas de obter o seu contributo para o que se está a realizar, garantindo que todas as crianças vejam representados os contributos dos seus pais/famílias.
    As reuniões de pais/famílias são um meio de participação coletiva em que o/a educador/a partilha as suas intenções educativas, o processo a desenvolver e/ou desenvolvido com o grupo, assim como envolve as famílias na elaboração do projeto curricular do grupo. Este envolvimento facilita a participação dos pais/famílias e a sua compreensão do trabalho pedagógico que se realiza na educação pré-escolar.
    A contribuição coletiva dos pais/famílias tem também expressão ao nível do estabelecimento educativo, numa relação organizacional, que os implica enquanto grupo. Os pais/famílias, enquanto primeiros e principais responsáveis pela educação das crianças, têm o direito de conhecer, escolher e contribuir para a resposta educativa que desejam para os seus filhos. Este é o sentido da constituição de associações de pais e da sua participação no projeto educativo, enquanto forma global como o estabelecimento educativo se organiza para dar uma melhor resposta à educação das crianças, às necessidades dos pais/famílias e às características da comunidade.
    Este contacto entre pais/famílias cujos/cujas filhos/as frequentam o mesmo estabelecimento educativo ou grupo de jardim de infância permite também a criação de relações informais, de solidariedade e de apoio mútuo entre famílias, que as ajudem a desempenhar as suas funções educativas e a tomar decisões sobre a educação dos filhos/as. O/a educador/a e/ou o estabelecimento educativo podem proporcionar condições para que essas relações se estabeleçam.
 
    Relações entre profissionais
 
    O estabelecimento educativo deverá também favorecer as relações, e o trabalho em equipa, entre profissionais que têm um papel na educação das crianças. Esse trabalho em equipa pode realizar-se a vários níveis: 
    ▪ Reuniões regulares da equipa que trabalha com o mesmo grupo de crianças: educador/a, auxiliar de ação educativa/assistente operacional, animadores/as da componente de apoio à família ou outros profissionais que intervenham com as crianças em tempo letivo (professor/a de educação especial ou professor/a com especialidade numa determinada área). Este trabalho é indispensável para desenvolver uma ação articulada, que se integra na dinâmica global do grupo e no trabalho que se está a realizar. 
    ▪ Encontros periódicos entre todos/as os/as educadores/as do estabelecimento/departamento de educação pré-escolar, para debater e refletir sobre a ação pedagógica desenvolvida e tomar decisões conjuntas sobre aspetos que dizem respeito ao seu trabalho, no estabelecimento educativo. Esta relação de cooperação, em que os/as educadores/as coordenam, planeiam e avaliam, em conjunto, a sua ação, constitui um meio de desenvolvimento profissional e de melhoria das práticas com efeitos na educação das crianças. Cabe ao diretor/a pedagógico/a ou coordenador/a pedagógico/a, em colaboração com os educadores, encontrar as formas e os momentos deste trabalho de equipa. Estas equipas podem ainda beneficiar do apoio de outros profissionais, tais como psicólogos, trabalhadores sociais, etc., que, enriquecendo o trabalho da equipa, facilitam a procura de respostas mais adequadas às crianças e às famílias.  
    ▪ Encontros entre profissionais de diferentes níveis educativos que, no estabelecimento educativo, estiveram ou irão estar encarregados da educação das mesmas crianças, nomeadamente educadores/as de creche, educadores/as do jardim de infância e professores/as do 1.º ciclo. Não cabe apenas individualmente ao/à educador/a, mas a toda a organização educativa garantir a articulação e a continuidade do processo na educação de cada criança.

    Relações com a comunidade
 
    A colaboração dos pais/famílias, e também de outros membros da comunidade, o contributo dos seus saberes e competências para o trabalho educativo a desenvolver com as crianças é um meio de alargar e enriquecer as situações de aprendizagem. O/A educador/a, ao dar conhecimento aos pais/famílias e a outros membros da comunidade, presencialmente ou à distância (blogue, plataforma da escola, etc.), do processo e produtos realizados pelas crianças a partir das suas contribuições, favorece um clima de comunicação, de troca e procura de saberes entre crianças e adultos.
    Para além da contribuição da comunidade para a aprendizagem das crianças, o estabelecimento educativo beneficia da colaboração com organizações, serviços e recursos da comunidade próxima e alargada (autarquias, serviços de saúde, segurança social, polícia de segurança pública, centros culturais e desportivos, instituições de ensino superior, etc.) para realizar as suas finalidades educativas. A cooperação com estes recursos da comunidade pode assumir a forma de parcerias formais, através de acordos ou protocolos com continuidade, ou ser solicitada pontualmente. Estas parcerias, para além de contribuírem para a realização das finalidades educativas do estabelecimento educativo, podem ainda facilitar a relação entre estes serviços e os pais/ famílias, através da disponibilização de informações sobre as suas funções e funcionamento.
    O contributo prestado pelos diversos recursos da comunidade ao estabelecimento educativo traduz-se num compromisso de dar conta dos resultados dessa cooperação. Garantir esta devolução dá visibilidade ao funcionamento do estabelecimento educativo e permite, nomeadamente, que a comunidade em geral compreenda as finalidades, as funções e os benefícios pedagógicos da educação pré-escolar.


    Sugestões de Reflexão:
    ▪ Como facilita a inserção de cada criança no grupo? 
    ▪ Como surgem as regras de funcionamento do grupo? Como são explicitadas e decididas? O que costuma fazer quando não são cumpridas? 
    ▪ Que espaços/áreas existem na sala? Que oportunidades de aprendizagem são proporcionadas pelas diferentes áreas e materiais? Como e por quê foram evoluindo ao longo do ano? Qual o contributo e participação das crianças para essa evolução? 
    ▪ Como é organizada a rotina diária, semanal e anual? Como é que estes diferentes momentos contribuem para as aprendizagens das crianças? Qual o seu papel nesses diferentes momentos e na promoção das aprendizagens que proporcionam? 
    ▪ A rotina diária inclui momentos em que as crianças estão em grande grupo, pequenos grupos, a pares e individualmente? Quais as potencialidades educativas destes diferentes tipos de organização do grupo? A partir do que observou, reflita sobre o que as crianças aprenderam em diferentes situações de interação, nomeadamente em pequenos grupos e a pares. 
    ▪ Como apoia as escolhas das crianças? Respeita as suas opções, integrando os seus interesses? Dá sugestões que permitam alargar as suas propostas?
   ▪ Como inclui os profissionais que colaboram na educação do grupo (assistentes operacionais/auxiliares de ação educativa, animadores, e outros) no desenvolvimento da ação educativa? 
    ▪ Os pais/famílias sentem-se à vontade para participar na dinâmica da sala? As estratégias para promover a colaboração das famílias são suficientemente diversificadas para dar oportunidades para que todos participem? 
    ▪ Tem conhecimento dos projetos pedagógicos de grupo das outras salas? Esses projetos e o seu desenvolvimento são debatidos em equipa? 
    ▪ Como envolve os membros da comunidade no processo educativo das crianças? 
    ▪ …"

Enquadramento Geral das Orientações Curriculares para a Educação de Infância (OCEPE)

"2. Intencionalidade educativa – construir e gerir o currículo


    A intencionalidade do/a educador/a, que caracteriza a sua intervenção profissional, exige-lhe que reflita sobre as conceções e valores subjacentes às finalidades da sua prática: papel profissional, imagem de criança, o que valoriza no que as crianças sabem e fazem e no modo como aprendem. Esta intencionalidade permite-lhe atribuir sentido à sua ação, ter um propósito, saber o porquê do que faz e o que pretende alcançar. 

    Destinando-se a apoiar a reflexão do/a educador/a sobre essa intencionalidade, as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar não constituem um programa a cumprir, mas sim uma referência para construir e gerir o currículo, que deverá ser adaptado ao contexto social, às características das crianças e das famílias e à evolução das aprendizagens de cada criança e do grupo. 

    Construir e gerir o currículo exige, assim, um conhecimento do meio e das crianças, que é atualizado, através da recolha de diferentes tipos de informação, tais como observações registadas pelo/a educador/a, documentos produzidos no dia a dia do jardim de infância e elementos obtidos através do contacto com as famílias e outros membros da comunidade. 
    Para que a informação recolhida possa ser utilizada na tomada de decisões fundamentadas sobre a prática, é necessário que seja organizada, interpretada e refletida. Avaliar consiste, essencialmente, nesse processo de análise e reflexão, no sentido de sustentar as decisões sobre o planeamento, cuja concretização irá conduzir a uma nova avaliação. Por isso, planificação e avaliação são interdependentes: a planificação é significativa se for baseada numa avaliação sistemática e a avaliação é útil se influenciar a planificação da ação e a sua concretização. 
    Planear e avaliar o processo educativo de acordo com o que o/a educador/a observa, regista e documenta sobre o grupo e cada criança, bem como sobre o seu contexto familiar e social é condição para que a educação pré-escolar proporcione um ambiente estimulante e promova aprendizagens significativas e diversificadas, que contribuam para uma maior igualdade de oportunidades. 
    Através de uma avaliação reflexiva e sensível, o/a educador/a recolhe informações para adequar o planeamento ao grupo e à sua evolução, falar com as famílias sobre a aprendizagem dos seus/suas filhos/as e tomar consciência da sua ação e do progresso das crianças, para decidir como apoiar melhor o seu processo de aprendizagem. 
    Observar, registar, documentar, planear e avaliar constituem etapas interligadas que se desenvolvem em ciclos sucessivos e interativos, integrados num ciclo anual. O conhecimento que vai sendo elaborado ao longo destes ciclos envolve um processo de análise e construção conjunta com a participação de todos os intervenientes (crianças, outros profissionais e pais/famílias), cabendo ao/à educador/a encontrar formas de comunicação e estratégias que promovam esse envolvimento e facilitem a articulação entre os diversos contextos de vida da criança.

    
    Observar, registar e documentar 
    Observar o que as crianças fazem, dizem e como interagem e aprendem constitui uma estratégia fundamental de recolha de informação. Porém, essa observação não se pode limitar às impressões que os/as educadores/as vão obtendo no seu contacto diário com as crianças, exigindo um registo que lhes permita contextualizar o que foi observado e situar essas informações no tempo. Anotar o que se observa facilita, também, uma distanciação da prática, que constitui uma primeira forma de reflexão.
    Para observar, registar e documentar o que a criança sabe e compreende, como pensa e aprende, o que é capaz de fazer, quais são os seus interesses, é indispensável que o/a educador/a selecione e utilize estratégias diversificadas.
    Para registar o que observa, o/a educador/a pode, por exemplo: 
▪ recolher episódios considerados significativos, que podem ser anotados durante o processo ou num momento imediatamente posterior; 
▪ utilizar instrumentos pedagógicos de observação sistemática, construídos pelo/a educador/a ou já existentes. Estes podem centrar-se num determinado aspeto ou situação (com que frequência e como as crianças utilizam determinada área da sala, em que ocasiões surgem conflitos, etc.) ou numa amostragem temporal, que tenha em conta diferentes momentos, dias e espaços (de manhã, de tarde, dentro da sala, no exterior, no refeitório).
    Sendo as observações registadas pelo/a educador/a um meio privilegiado de recolha de informação, há muitos outros registos ou documentos, que decorrem da prática pedagógica, e que podem ser utilizados como “memórias” para reconstituir e compreender o processo educativo e as aprendizagens das crianças. Estão entre esses documentos:
 ▪ registos de apoio à organização do grupo (quadro de presenças, registo das regras acordadas, quadro de tarefas ou outros), os documentos produzidos com as crianças, em que o/a educador/a escreve o que dizem em grande grupo ou em pequeno grupo, as histórias que contam, etc; 
 ▪ produções individuais ou coletivas das crianças, os registos dos projetos realizados pelo grupo; 
 ▪ registos audiovisuais que documentam momentos e aspetos significativos da vida do grupo ou do processo (fotografias, gravações áudio ou vídeo feitas por adultos ou crianças).
    Para além destes, há ainda os documentos produzidos pelo/a educador/a para orientar o seu trabalho e refletir sobre a sua intervenção (planificações, diários de prática, ou sínteses do trabalho realizado com o grupo e com as famílias, etc.).
    O/A educador/a recolhe, ainda, informação sobre o contexto de vida das crianças e a sua ação junto das famílias e comunidade, através de, por exemplo, registos de presença e da participação dos pais/famílias em reuniões ou em atividades da sala, bem como das relações com parceiros da comunidade. As opiniões destes intervenientes são também uma informação relevante, que pode ser obtida através da anotação de conversas informais, ou recorrendo a instrumentos mais organizados e estruturados, tais como entrevistas ou questionários.
    Compreender a criança no seu contexto implica que o/a educador/a selecione e utilize diferentes formas e meios de observação e registo, que lhe permitam “ver” a criança sob vários ângulos e situar essa “visão” no desenvolvimento do seu processo de aprendizagem. A organização, análise e interpretação dessas diversas formas de registo constitui-se como um processo de documentação pedagógica, que apoia a reflexão e fundamenta o planeamento e a avaliação.



    Planear, agir e avaliar
    Planear implica que o/a educador/a reflita sobre as suas intenções educativas e as formas de as adequar ao grupo, prevendo situações e experiências de aprendizagem e organizando recursos necessários à sua realização. Planear permite, não só antecipar o que é importante desenvolver para alargar as aprendizagens das crianças, como também agir, considerando o que foi planeado, mas reconhecendo simultaneamente oportunidades de aprendizagem não previstas, para tirar partido delas.
    Planear não é, assim, prever um conjunto de propostas a cumprir exatamente, mas estar preparado para acolher as sugestões das crianças e integrar situações imprevistas que possam ser potenciadoras de aprendizagem.
    O desenvolvimento da ação planeada desafia o/a educador/a a questionar-se sobre o que as crianças experienciaram e aprenderam, se o que foi planeado correspondeu ao pretendido e o que pode ser melhorado, sendo este questionamento orientador da avaliação.
    De acordo com a perspetiva referida, avaliar consiste na recolha da informação necessária para tomar decisões sobre a prática. Assim, considera-se a avaliação como uma forma de conhecimento direcionada para a ação. Para que a informação recolhida possa ser utilizada para fundamentar as decisões sobre o desenvolvimento do currículo, o/a educador/a, de acordo com as suas conceções e opções pedagógicas, escolhe formas diversificadas de registar o que observa das crianças, seleciona intencionalmente os documentos resultantes do processo pedagógico e da interação com pais/famílias e outros parceiros, de forma a dispor de um conjunto organizado de elementos que lhe permitam periodicamente rever, analisar e refletir sobre a sua prática. Para realizar essa seleção, o/a educador/a questiona-se, também, sobre o que pretende saber ao longo do tempo, ou num determinado momento, reflete sobre o que é mais útil e pertinente recolher, como e quando o fazer, como e quando organizar e analisar esses registos e documentos, ou seja, planeia a avaliação.
    O termo “avaliar”, no seu sentido etimológico, remete para a atribuição de um valor, por isso, a avaliação é muitas vezes entendida como a classificação da aprendizagem, sendo que algumas perspetivas teóricas a descrevem como a realização de juízos de valor. Articulando estas conceções com a definição de avaliação apresentada, considera-se que a educação pré-escolar não envolve nem a classificação da aprendizagem da criança, nem o juízo de valor sobre a sua maneira de ser, centrando-se na documentação do processo e na descrição da sua aprendizagem, de modo a valorizar as suas formas de aprender e os seus progressos.
    Avaliar os progressos das crianças consiste em comparar cada uma consigo própria para situar a evolução da sua aprendizagem ao longo do tempo. Refletir sobre esses progressos e o valor que atribui às experiências de aprendizagem das crianças permite ao/a educador/a tomar consciência das conceções subjacentes à sua intervenção pedagógica e o modo como estas se concretizam na ação. Possibilita-lhe, ainda, explicitar o que valoriza e fundamentar as razões das suas opções, junto de outros intervenientes no processo educativo (outros profissionais, pais/famílias). Sabendo que os vários intervenientes podem ter valores e conceções diversos, a sua explicitação pode fundamentar um diálogo construtivo e formativo para todos.
    A avaliação na educação pré-escolar é reinvestida na ação educativa, sendo uma avaliação para a aprendizagem e não da aprendizagem. É, assim, uma avaliação formativa por vezes também designada como “formadora”, pois refere-se a uma construção participada de sentido, que é, simultaneamente, uma estratégia de formação das crianças, do/a educador/a e, ainda, de outros intervenientes no processo educativo.
    Esta perspetiva de avaliação contextualizada (baseada em registos de observação e recolha de documentos situados no contexto), significativa e realizada ao longo do tempo, em situações reais, é também designada “avaliação autêntica” ou “avaliação alternativa”. Embora possa ser utilizada noutros níveis educativos, esta forma de avaliar tem particular importância na educação pré-escolar, em que, fazendo parte integrante e fundamental do desenvolvimento curricular, é inseparável da prática educativa.
 
     Planeamento e avaliação – um processo participado
    A integração do planeamento e avaliação na prática educativa implica o envolvimento ativo dos diferentes participantes: crianças, pais/famílias e outros profissionais. Considerar a criança como agente do processo educativo e reconhecer-lhe o direito de ser ouvida nas decisões que lhe dizem respeito confere-lhe um papel ativo no planeamento e avaliação do currículo, constituindo esta participação uma estratégia de aprendizagem. Assim, planear com as crianças, individualmente, em pequenos grupos ou no grande grupo são  oportunidades de participação nas decisões sobre o currículo, em que a criança faz propostas, prevê como as vai pôr em prática e com quem. Essa participação constitui um meio de formação pessoal e social, de desenvolvimento cognitivo e da linguagem e permite, ainda, que o grupo beneficie da diversidade de capacidades e saberes de cada criança.
    Enquanto protagonista da sua aprendizagem, é também fundamental envolver a criança na avaliação, descrevendo o que fez, como e com quem, como poderia continuar, melhorar ou fazer de outro modo, tomando, assim, consciência dos seus progressos e de como vai ultrapassando as suas dificuldades. É essencial que numa fase inicial o/a educador/a apoie a criança no desenvolvimento deste processo de autoavaliação, que a vai ajudar a aprender a prever o que quer fazer e, por conseguinte, a planear melhor. A oportunidade de partilhar com os pares e de se confrontar com diferentes opiniões e avaliações leva a que este processo se torne mais rico e reflexivo, dado que implica compreender a perspetiva do outro e explicar as suas opiniões. 
    Prever o que se vai fazer, tomar consciência do que foi realizado são condições da organização democrática do grupo, como também o suporte da aprendizagem articulada nas diferentes áreas de conteúdo, nomeadamente para que a criança tome consciência de si como aprendente, desenvolva a curiosidade e o desejo de aprender.
    A participação no planeamento e avaliação de outros profissionais que trabalham com o mesmo grupo de crianças é um dos meios de garantir a coerência do currículo e de ter outros “olhares” sobre a aprendizagem das crianças.
    Os pais/famílias, como principais responsáveis pela educação dos filhos/as, têm também o direito de participar no desenvolvimento do seu percurso pedagógico, não só sendo informados do que se passa no jardim de infância, como tendo também oportunidade de dar contributos que enriqueçam o planeamento e a avaliação da prática educativa. 


    A participação destes diferentes intervenientes e de outros membros da comunidade no planeamento, realização e avaliação de oportunidades educativas é uma forma de alargar as interações e de enriquecer o processo educativo. Cabe ao/a educador/a criar as condições necessárias para essa participação, encontrando as formas de comunicação e articulação mais adequadas.

     Planeamento, ação, avaliação – o desenvolvimento do ciclo
    A construção e desenvolvimento do currículo e a sua adaptação ao grupo de crianças que, em cada ano, frequenta o jardim de infância inicia-se através da recolha de informação sobre o contexto social e familiar da criança, bem como sobre o processo educativo anteriormente realizado, no jardim de infância, se já o frequentou, ou sobre as experiências de aprendizagem que as crianças vivenciaram no contexto familiar e/ou na creche. Para além da informação sobre o percurso anterior, o/a educador/a observa também cada criança e as suas interações no grupo, para perceber se se sente bem e está integrada e para conhecer os seus saberes e interesses (observando o que a criança faz, como interage, ouvindo o que diz, recolhendo diversos trabalhos que realiza, etc.).
    É a partir deste conjunto de informações, ou seja, desta primeira avaliação ou caracterização inicial, que o/a educador/a explicita as suas intenções educativas, planeia a sua intervenção, elaborando o projeto curricular de grupo em articulação com o projeto educativo do estabelecimento educativo/agrupamento de escolas.
    O planeamento do projeto curricular de grupo vai sendo regulado e melhorado, através da avaliação, tanto da intervenção do/a educador/a na organização do ambiente educativo e no desenvolvimento do processo, como dos efeitos dessa intervenção na evolução do grupo e nos progressos de aprendizagem de cada criança. A interligação entre planeamento, ação e avaliação tem como consequência que os aspetos incluídos no planeamento sejam também contemplados na avaliação.
    A organização do ambiente educativo, enquanto suporte do desenvolvimento curricular, é planeada como um contexto culturalmente rico e estimulante. A apropriação desse ambiente por parte das crianças contribui para o desenvolvimento da sua independência, sendo que as oportunidades de participação nas decisões sobre essa organização favorecem a sua autonomia. A avaliação da organização do ambiente educativo permite ao/à educador/a refletir sobre as suas potencialidades educativas, a partir do que observa: exploração e utilização dos espaços e materiais; interações e relações entre crianças e entre crianças e adultos; distribuição e utilização do tempo. É a partir dessa observação, e da escuta das opiniões e sugestões das crianças e de outros elementos da equipa pedagógica, que a organização do ambiente educativo vai sendo melhorada e ajustada.
    A intervenção do/a educador/a no processo pedagógico vai sendo planeada tendo em conta os fundamentos e princípios subjacentes a estas Orientações Curriculares, nomeadamente uma abordagem integrada e globalizante das diferentes áreas de conteúdo e a exigência de dar resposta a todas as crianças. Neste sentido, define as suas intenções pedagógicas, prevendo propostas abrangentes atrativas e significativas, que, podendo incidir numa área ou domínio, tenham em conta não só a articulação entre eles, mas também que todos são contemplados de modo equilibrado. 
    Sendo a criança sujeito e agente do processo educativo, participa e é ouvida nas propostas da iniciativa do/a educador/a, que está atento/a e apoia as propostas implícitas ou explícitas da criança.
    A observação do brincar e de situações da iniciativa das crianças é um meio de conhecer os seus interesses, um conhecimento que pode ser utilizado para o/a educador/a planear novas propostas, ou apoiar o desenvolvimento de projetos de pequenos grupos ou de todo o grupo.
    À medida que o processo se desenvolve, o projeto curricular de grupo vai sendo revisto e ajustado, através de ciclos sucessivos de planeamento, ação e avaliação, que se vão alargando e aprofundando, ao longo do ano. Assim, o/a educador/a prevê em cada dia a sua ação do dia seguinte, sendo que, a partir do que observa, regista e documenta sobre o desenvolvimento do processo e das aprendizagens das crianças, recolhe elementos para avaliar e refletir, numa base semanal ou mensal. Esta reflexão, sobre a pertinência e sentido das oportunidades educativas proporcionadas, permite perceber se contribuíram para a aprendizagem de todas e de cada uma das crianças.
    De acordo com a organização do ano letivo, esta avaliação será estruturada e resumida por escrito no final de cada momento intermédio, dando lugar, no final do ano, a uma síntese global de avaliação do projeto curricular de grupo e dos seus efeitos nas aprendizagens das crianças.
     A autoavaliação da intervenção do/a educador/a e a avaliação do desenvolvimento do processo é essencial numa perspetiva de avaliação formativa, em que a avaliação é reinvestida na ação. A avaliação do processo permite também saber em que medida as crianças se envolveram nas atividades e projetos e quais as aprendizagens que vão realizando. Através dessa avaliação, o/a educador/a vai ajustando o seu planeamento e intenções pedagógicas, de modo a estabelecer uma progressão que desafie cada criança.
    Uma perspetiva de avaliação formativa centrada no desenvolvimento do processo e nos progressos da aprendizagem de cada criança não se enquadra em abordagens de avaliação normativa, em que essa aprendizagem é situada face a normas ou padrões previamente estabelecidos. Assim, nesta perspetiva, não tem sentido situar o nível de desenvolvimento da criança, ou em que medida foram atingidos objetivos ou metas de aprendizagem previamente estabelecidos. A definição de objetivos desejáveis ou esperáveis será, eventualmente, utilizada como uma referência para situar e descrever o que a criança aprendeu e a evolução dessa aprendizagem, ou, ainda, para alertar o/a educador/a da necessidade de reformular a sua intervenção, de modo a incentivar os progressos de todas e cada uma das crianças. Uma avaliação sumativa que quantifica ou estabelece níveis de aprendizagem não se enquadra nesta abordagem de avaliação formativa.
    A avaliação do progresso de cada criança, situada no contexto e processo em que se desenvolveu, utiliza abordagens descritivas ou narrativas, que documentam a evolução desse progresso e constituem o meio fundamental da avaliação designada como “alternativa”. São exemplos deste tipo de avaliação a construção de portefólios ou histórias de aprendizagem, em que a criança é envolvida na seleção de trabalhos, imagens e fotografias que fazem parte desse registo. Os comentários da criança que acompanham essa seleção também fazem parte dessa documentação, bem como anotações e registos do/a educador/a e/ou dos pais/famílias. Este tipo de instrumento permite à criança participar no planeamento e avaliação da sua aprendizagem, rever o processo e tomar consciência dos seus progressos.
    Dada a importância do contexto familiar na educação das crianças, o/a educador/a também planeia e avalia a sua ação junto dos pais/famílias, prevendo estratégias que incentivem a sua participação, permitindo-lhe conhecer melhor o contexto familiar e social das crianças e envolver os pais/famílias no processo educativo, ajustando e reformulando a sua ação em função da avaliação dessas práticas.
    A avaliação destas diferentes dimensões apoia a reflexão fundamentada do/a educador/a sobre a sua prática pedagógica e o modo como concretiza a sua intencionalidade, possibilitando ainda tornar essa prática visível e facilitar a participação dos diferentes intervenientes no processo educativo.


    Comunicar e articular
    O desenvolvimento de um processo participado de planeamento e avaliação implica uma partilha de informação e um processo de reflexão entre os diferentes intervenientes. Cabe ao/à educador/a criar um clima de comunicação em que crianças, outros profissionais e pais/ famílias são escutados e as suas opiniões e ideias consideradas e debatidas.
    A participação das crianças no planeamento e avaliação implica que o/a educador/a seja um ouvinte atento, que toma em consideração as suas propostas e sugestões, questionando-as para perceber melhor as suas ideias e para que tomem consciência dos seus progressos.
    Também, no dia a dia, o/a educador/a valoriza o que a criança faz, dando-lhe feedback construtivo centrado no seu empenhamento e na procura de resolução das dificuldades que se lhe colocam, de modo a contribuir para a construção da sua identidade e autoestima e a promover a sua persistência e desejo de aprender.
    A comunicação das intenções do/a educador/a e do seu projeto curricular de grupo aos pais/famílias é uma ocasião para os envolver no processo de planeamento e para recolher as suas sugestões. A partilha desse plano permite, ainda, encontrar um conjunto de possibilidades de os pais/famílias e outros elementos da comunidade participarem no processo educativo do jardim de infância.
    Ao longo do ano, o/a educador/a vai dando conta do desenvolvimento do processo educativo e do progresso das aprendizagens das crianças, através de reuniões e contactos informais com os pais/famílias. Um diálogo que facilite relações de confiança mútua permite aos pais/ famílias expor as suas opiniões, expectativas e dúvidas e ser esclarecidos sobre as opções tomadas pelo/a educador/a. Para além disso, permite ao/a educador/a compreender melhor os contextos familiares das crianças do seu grupo e adequar a sua intervenção educativa.
    A partilha da avaliação de cada criança com os pais/famílias, tornando visível o processo pedagógico e os progressos do seu/sua filho/filha, permite-lhes compreender as aprendizagens que realizaram, mas também contribuir para essa avaliação, através do que conhecem da criança e observam em casa, facilitando a articulação entre a educação familiar e o processo educativo no jardim de infância.
     A participação dos vários elementos da equipa da sala na reflexão sobre o processo pedagógico e as aprendizagens das crianças, apoiada em registos e documentos, permite que haja articulação e coerência entre práticas no processo educativo.
    Também a partilha, debate e reflexão conjunta entre os elementos da equipa de educadores/as do mesmo estabelecimento educativo/departamento curricular, sobre o desenvolvimento do trabalho pedagógico e dos instrumentos de planeamento e avaliação em que se apoiam, constitui um meio privilegiado de desenvolvimento profissional e de melhoria das práticas.
    Esta comunicação entre educadores/as que trabalham no mesmo estabelecimento educativo permite-lhes igualmente decidir, em conjunto, formas de envolvimento e de articulação com docentes de outros níveis, nomeadamente com professores do 1.º ciclo. Permite-lhes ainda decidir como transmitir a informação sobre o processo desenvolvido no jardim de infância e a síntese das aprendizagens realizadas por cada criança, de modo a facilitar a transição e a continuidade entre a educação pré-escolar e o ensino obrigatório.
    Importa que os/as educadores/as reflitam individualmente, e em conjunto, sobre a melhor maneira de comunicar informações acerca de cada criança, tendo em conta os destinatários. Essa comunicação respeita princípios éticos e deontológicos que deverão orientar a sua prática tendo em conta o superior interesse da criança, não se centrando nos seus insucessos mas sim nas suas conquistas e descobertas, assim como não divulgando informação confidencial e respeitando a privacidade das crianças e famílias.
    Este processo fundamentado e partilhado de desenvolvimento do currículo é fundamental para compreender, interpretar e atribuir significado à aprendizagem das crianças e apoiar a reflexão do/a educador/a sobre a sua prática pedagógica e o modo como concretiza a sua intencionalidade.

    Sugestões de Reflexão:
    ▪ Existe coerência entre a sua intencionalidade educativa e as práticas de observação, documentação e avaliação que utiliza (por exemplo, defende um currículo baseado nos interesses das crianças e só regista e documenta o que é realizado por proposta do/a educador/a)?

    ▪ Planeia uma recolha e organização da informação diversificadas mas que seja exequível, selecionando o que é mais importante e pertinente? Prevê uma periodicidade para analisar essa informação e refletir sobre ela? 
    ▪ Procura que a informação seja recolhida e organizada de forma a ter um conhecimento o mais objetivo possível do processo e da aprendizagem das crianças? Escolhe ou constrói instrumentos de observação? Recolhe e organiza os documentos de forma a poderem ser úteis para compreender o processo e a aprendizagem das crianças? Analisa os progressos das aprendizagens das crianças tendo em conta a sua intervenção? 
    ▪ O que aprendeu com a análise e reflexão do que observa, regista e documenta? Em que aspetos essa informação influenciou o planeamento, a melhoria do processo e das práticas educativas? Como a partilhou com a equipa de sala? 
    ▪ Partilha, debate e reflete regularmente com outros/as educadores/as o seu projeto curricular de grupo, os instrumentos de observação e registo e a forma como os utiliza e organiza? 
   ▪ O planeamento e a avaliação são participados e negociados envolvendo os diferentes intervenientes? Como e quando é que as crianças participam? Quais as oportunidades de participação que são dadas aos pais/famílias? O relato da avaliação é pensado em função dos destinatários: pais/famílias, outros profissionais, etc.? 
   ▪ A comunicação do processo e progressos da aprendizagem respeita normas éticas e deontológicas? Centra-se nos aspetos positivos e nos progressos das crianças? Não são divulgadas informações que possam prejudicar a criança e diminuir a sua autoestima? Respeita a privacidade das crianças e famílias?   
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